Observador: 'Eurodeputados portugueses dividem-se na leitura do discurso do estado da UE'
Os eurodeputados portugueses dividiram-se profundamente na apreciação do discurso do estado da União esta manhã apresentado pela presidente da Comissão Europeia (CE), Ursula von der Leyen, no Parlamento Europeu.
O eurodeputado do PSD Paulo Rangel disse à Lusa ter ouvido uma intervenção “inteligente”, em que von der Leyen fez um retrato “muito positivo” da atuação da CE, destacando as referências ao processo de vacinação contra a Covid-19 em que, “com todo o mérito”, a “estratégia europeia foi bem-sucedida”.
Já Marisa Matias, do Bloco de Esquerda, ouviu um discurso que “passou ao lado” dos temas “que realmente interessam“, dizendo que houve “uma abordagem de fingimento” relativamente àqueles que foram tratados.
Em declarações à Lusa, Marisa Matias deu como exemplo desse “fingimento”, a forma como Von der Leyen falou da recuperação económica da União Europeia (UE), mas “ignorando que estão em suspenso as regras do défice”, que tem permitido um alívio financeiro para muitos países, sem que a presidente da Comissão Europeia explicasse o que vai acontecer nos próximos tempos.
João Pimenta Lopes, eurodeputado eleito pelo PCP, criticou profundamente todo o discurso do estado da União, em particular a forma como von der Leyen elogiou o desempenho da CE no processo de vacinação, sublinhando que permanece o que considera ser “a continuidade de postura obstinada em defender as multinacionais”, nomeadamente com a insistência na proteção das patentes das vacinas contra a Covid-19.
Não foi este o espírito com que Carlos Zorrinho, eurodeputado do PS, ouviu a presidente da Comissão Europeia, dizendo que ela mostrou “uma prova de sensibilidade em relação ao sentido, à integridade e à relevância” da UE.
Ainda assim, “pelos nossos valores e pelo nosso futuro, teremos de ser mais ambiciosos e pragmáticos” considera Zorrinho, explicando que falta, por exemplo, uma lei anti-pobreza “que consolide e aprofunde os objetivos da declaração do Porto”, numa referência à recente Cimeira Social.
Nuno Melo, eurodeputado do CDS, também aprovou a forma como a presidente da CE se referiu ao papel da UE na distribuição mundial de vacinas contra a Covid-19, mas preferia ter ouvido falar um pouco mais sobre a estratégia económica da comunidade, a médio e a longo prazo, nomeadamente para se perceber melhor o que fazer com a distribuição dos fundos comunitários.
Paulo Rangel salientou a “visão otimista” que von der Leyen trouxe para o discurso económico, mas lembrou que faltou falar sobre o preço a pagar pelo plano de recuperação e resiliência, em particular a eventualidade de uma subida da inflação, tal como ficaram de fora referências à política fiscal e económica da UE, como por exemplo, definir as futuras metas para o endividamento.
Francisco Guerreiro, eurodeputado independente (ex-PAN) da família dos Verdes, ouviu um “discurso moderado e cauteloso”, mas criticou a falta de aprofundamento de muitos temas que lhe são queridos, como a questão da política ambiental, bem como a ausência de temas fundamentais, como a Política Agrícola Comum.
Guerreiro atacou ainda o tom de “investimento militarista” na área da Defesa, partilhando das críticas duras feitas nesta área pelo comunista João Pimenta Lopes, que também referiu a “postura de aprofundamento da vertente militarista”, com menções explícitas a um “exército europeu”, através de um discurso que “se afasta do espírito da Carta das Nações Unidas”.
Marisa Matias sentiu ainda “um discurso vazio” no que diz respeito ao tema das migrações, alegando que a presidente da CE se limitou a ideias vagas, que remetem para o papel do Parlamento Europeu, tal como também disse não ter percebido a razão por que von der Leyen salientou o anúncio de uma cimeira para a Defesa, quando esta questão não está na agenda prioritária da UE.
Em sentido contrário, Paulo Rangel considera que na questão da Defesa foi “assertiva” relativamente à importância do reforço da colaboração estreita entre a UE e a NATO — um aspeto muito criticado pelos eurodeputados comunista e bloquista, bem como por Francisco Guerreiro.
A presidente da Comissão Europeia falou esta quarta-feira no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, no discurso do Estado da União, onde fez o balanço deste ano e projetou as prioridades para 2022.
O primeiro discurso do Estado da União foi proferido pelo então presidente da Comissão José Manuel Durão Barroso em 07 de setembro de 2010, uma prática que foi seguida pelo seu sucessor, Jean-Claude Juncker, e pela atual chefe do executivo comunitário.
Ursula Von der Leyen, que tomou posse em 01 de dezembro de 2019, fez a sua primeira intervenção deste género em 16 de setembro de 2020.
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