Expresso - Crise climática é uma batalha perdida ou ainda há tempo para o Parlamento Europeu agir? A resposta pode depender do resultado eleitoral.

Expresso - Crise climática é uma batalha perdida ou ainda há tempo para o Parlamento Europeu agir? A resposta pode depender do resultado eleitoral.

  • Segunda-feira, 03 de Junho de 2024

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Desde tinta em quadros até à greve climática estudantil, as alterações climáticas têm sido tema recorrente de discussão. No Parlamento Europeu, foram muitas as estratégias e políticas aprovadas para mitigar os efeitos desta crise e preparar o continente para se tornar climaticamente neutro até 2050. Mas será que conseguimos chegar lá?

Um dos temas que mais marcou a legislatura no Parlamento Europeu (PE) foi o combate às alterações climáticas. Em 2019, no primeiro ano de mandato, os eurodeputados declararam situação de emergência climática e incentivaram os Estados-membros a limitar o aquecimento global e travar a grave perda de biodiversidade.

Entre várias medidas ambiciosas tomadas ao longo dos últimos cinco anos, a nova Lei Europeia do Clima estabelece a meta de redução de emissões na União Europeia (UE) em, pelo menos, 55% até 2030. A par deste objetivo, foi implementada uma estratégia preponderante da UE, o Pacto Ecológico Europeu, que estabelece medidas para alcançar a neutralidade climática na Europa até 2050.

“A crise climática não está resolvida, temos de nos manter no caminho certo e precisamos de mais e melhor legislação”, afirmou Tiemo Wölken, eurodeputado alemão do grupo S&D (que o PS integra) e membro da Comissão do Ambiente, da Saúde Pública e da Segurança Alimentar, que tem mais de 80 membros e é uma das maiores do PE. Numa conferência com os jornalistas, o eurodeputado disse que “estabelecer objetivos é bom e útil, mas isso não melhora o clima”, por isso, é preciso impor “legislação para colocar os objetivos num cenário realista” e há “muitos instrumentos a nível da UE para cumprir efetivamente os objetivos”.

Uma das mais recentes legislações foi o pacote ‘Objetivo 55’, que determina e atualiza várias estratégias para alcançar as metas de redução de emissões na UE e tornar a Europa o primeiro continente climaticamente neutro. “É o roteiro da descarbonização da nossa economia”, explica a eurodeputada portuguesa Lídia Pereira, do PSD, membro do Partido Popular Europeu (PPE), que acredita que “estes cinco anos de mandato no Parlamento Europeu foram muito ricos do ponto de vista da produção legislativa em matéria de ambiente”.

Para a eurodeputada laranja, que integrou a comitiva do PE na COP27, “o ambiente e o clima estiveram sempre no topo das prioridades da agenda europeia”. “Nós estamos no bom caminho, a Europa é líder e a Europa é quem mais faz, neste momento, no mundo pelo combate às alterações climáticas, mas sozinha não consegue travar as alterações climáticas e é, por isso, tão importante que os outros países estejam também a bordo desta transição”, afirma.

“Este é um dos temas em que nós não podemos dar nenhum passo atrás”, declara o eurodeputado do PS, João Albuquerque. Alerta que há muitas forças que se mobilizam “contra as ambições da União Europeia” e que “planeta só há um”. O eurodeputado, membro da bancada dos Socialistas e Democratas (S&D) e responsável por uma diretiva para prevenir as perdas de pellets e reduzir a poluição destes microplásticos, defende que é preciso ser “intransigente” com as estratégias de combate à crise climática e que é necessário garantir, no próximo mandato, que os objetivos de neutralidade carbónica vão ser cumpridos.

A Lei do Restauro da Natureza foi uma das legislações mais noticiadas pelos órgãos de comunicação durante este mandato. Com mais de 80% dos habitats europeus em mau estado, esta legislação obriga os Estados-membros a regenerar desde florestas até lagos. Até 2030, devem restaurar, pelo menos, 30% dos habitats em mau estado, em 2040 o objetivo sobe para 60% e em 2050 atinge os 90%.

Esta legislação, aprovada em fevereiro deste ano, demonstra a dualidade entre a esquerda e a direita, com vários recuos, discussões e uma recomendação do Partido Popular Europeu (onde se inserem o PSD e o CDS) feita momentos antes da última votação para que os seus eurodeputados votassem contra. Contudo, muitos votaram a favor e o diploma consegui ser, finalmente, aprovado. “Passou a ser um confronto esquerda/direita, com os grupos à esquerda a defender legislação mais exigente e com a direita a aliar-se à extrema-direita negacionista para bloquear muitas dessas medidas”, defende o eurodeputado do Bloco de Esquerda, José Gusmão.

Gusmão considera que esta polarização tem prejudicado a implementação de medidas “imprescindíveis” para cumprir os objetivos da União Europeia. Uma situação que atrasa a “políticas que apoiam as famílias, que têm um impacto social positivo, que criam empregos verdes e que seriam uma ótima forma de estimular a economia”.

“À custa desse caminho de uma chamada transição justa e verde encerraram-se [empresas] com prejuízo para o país sem que daí tivesse havido um ganho ambiental do ponto de vista de emissões, porque elas foram transitadas para outro sítio”, afirma o eurodeputado do PCP, João Pimenta Lopes. Para exemplificar a situação destaca o encerramento da refinaria de Matosinhos, que provocou uma perda de cerca de 1.500 postos de trabalho, “a dependência do país do ponto de vista da refinação e dos produtos que aí eram produzidos e que tiveram de passar a ser importados, da energia que aí era gerada e que passou a ter que passar a fronteira para o nosso país”.

É preciso “mudar o paradigma económico, mudar o paradigma produtivo para atender aquilo que são preocupações ambientais” defende João Pimenta Lopes, que tece ainda críticas ao fundo social para o clima, um apoio às famílias e pequenas empresas afetados pela pobreza energética e de transportes. “Era um fundo social, além de insuficiente, que prejudicava singularmente Portugal, porquê? Porque na chave de alocação, comparado com outros países da coesão, Portugal era tratado como se não fosse um país da coesão, determinando uma alocação financeira inferior aquilo que será feita aos países de coesão”, afirma.

Francisco Guerreiro, eurodeputado independente após a sua desfiliação com o PAN, partido pelo qual foi eleito em 2019, garante que o objetivo de atingir a neutralidade carbónica até 2050 “não é realista” e alerta para a corrosão de alguns regulamentos de proteção do ambiente pelas forças conservadoras. 

Na política agrícola comum, “já houve uma série de derrogações das medidas que garantiam que os produtores que cumprissem com os pressupostos de transição ecológica tivessem apoios”, explica. São os “grandes lobbies da indústria agrícola, os grandes lobbies da indústria agroquímica, que estão a fazer esta pressão nos partidos tradicionais para erodir uma série de legislação de proteção ambiental”.

A conservação e proteção do meio ambiente marinho é um dos aspetos que mais preocupa o eurodeputado, Vasco Becker-Weinberg do CDS, que destaca o Tratado do Alto Mar, que tem o objetivo de proteger os oceanos, prevenir a perda de biodiversidade marítima e combater a degradação. “Devemos também estar no pelotão da frente no processo de ratificação e de implementação deste acordo e estamos a correr contra o tempo porque temos aqui uma meta para conseguir que este acordo entre em vigor”, diz.

“Os Estados devem verdadeiramente investirem, não só através da criação e classificação de áreas marinhas protegidas, por exemplo, mas sobretudo através de programas e projetos de gestão eficazes de áreas marinhas protegidas” para não serem “apenas áreas marinhas protegidas que existem no papel”, diz.

Para combater as alterações climáticas será utilizado pelo menos 30% do orçamento da UE, e cerca de 8% será alocado para a biodiversidade. A faltarem menos de 30 anos até 2050, altura em que se definiu que a Europa se tornará o primeiro continente neutro climaticamente, as opiniões dos eurodeputados dividem-se sobre a exequibilidade desta ambição. Existe uma certeza para os políticos portugueses que participaram nesta legislatura no Parlamento Europeu: é preciso tomar ações rápidas e não pode haver recuos.

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