Expresso - Eleições ao Parlamento Europeu: defender a natureza e o clima só depende do seu voto no dia 9
Muitas vezes nos queixamos, enquanto eleitores, que após votarmos e delegarmos a nossa confiança nos políticos não sabemos bem o que se passa em Bruxelas e Estrasburgo. Ora, este poderoso instrumento devolveu-nos a transparência e a accountability que tanta falta nos fazia. Pelo menos no domínio ambiental, sabemos exatamente o que fizeram com o nosso voto.
Quando uma aliança europeia que reúne centenas de organizações não governamentais de Ambiente (ONGA) divulgou um Barómetro que mostra como votaram os nossos 21 eurodeputados no Parlamento Europeu (PE) nos últimos 5 anos, num conjunto de 30 dossiers legislativos considerados estratégicos na defesa do Ambiente, do Clima e contra a poluição generalizada do nosso quotidiano por químicos perigosos e agrotóxicos, alguns partidos reagiram de imediato, tentando desmentir os factos. Não tinham ficado (nada) bem na fotografia!
Alguns desses partidos ficaram mesmo abaixo da média dos seus grupos parlamentares no PE, designadamente o CDS e o PCP. Também tivemos os parlamentares “exemplares”, caso do independente Francisco Guerreiro, que obteve 99 pontos numa escala de 100, acima da média (92/100) do seu grupo, os Verdes/ Aliança Livre Europeia. O facto é que até a atual Ministra do Ambiente e Energia, votou apenas 27 vezes, em 100, a favor da natureza, enquanto eurodeputada entre 2019 e 2024.
Mas no atual Governo Maria da Graça Carvalho não está só. Na sua passagem pelo PE, Paulo Rangel, Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, desceu a fasquia mais abaixo (26 pontos em 100). O Ministro da Defesa Nacional, Nuno Melo, mostrou a menor sensibilidade aos valores ambientais (20 pontos no total de 100, ou seja, uma em cada 5 vezes votou contra a prevenção da perda de biodiversidade, o clima ou a descontaminação do planeta). Já José Manuel Fernandes, atual Ministro da Agricultura e Pescas, obteve 28 pontos em 100 a favor da natureza.
O desempenho ambiental medíocre tanto do PSD como do CDS classificou ambos os partidos no grupo negro (neste caso vermelho) dos “Pensadores pré-históricos”. O PCP levou um cartão amarelo, tendo ficado no grupo intermédio (Procrastinadores, com 67 pontos em 100). E apenas o Bloco de Esquerda (91 pontos em 100) e o PS (com 79 pontos) chegaram ao “pelotão da frente”, os “Protetores”.
Muitas vezes nos queixamos, enquanto eleitores, que após votarmos e delegarmos a nossa confiança nos políticos não sabemos bem o que se passa em Bruxelas e Estrasburgo. Ora, este poderoso instrumento devolveu-nos a transparência e a accountability que tanta falta nos fazia. Pelo menos no domínio ambiental, sabemos exatamente o que fizeram com o nosso voto!
É verdade que alguns partidos portugueses que agora concorrem às europeias não estão representados neste Barómetro. No entanto, a serem eleitos, os respectivos candidatos integrarão, de acordo com a sua família política, algum dos 7 grupos parlamentares cuja classificação foi, por ordem decrescente: Verdes/ Aliança Livre Europeia (92/100); A Esquerda (Left – 84/100); Socialistas e Democratas (70/100); Renew Europe (56/100); Partido Popular Europeu (PPE – 25/100); Conservadores e Reformistas Europeus (ECR – 10/100) e Identidade e Democracia (ID – 6/100).
E porque é importante voltar a falar do Barómetro? Porque infelizmente e mesmo sendo pagos com dinheiro dos contribuintes apenas uma minoria de corajosos eurodeputados esteve de facto empenhada em adotar a necessária e urgente ação quanto à natureza, poluição e clima. O PPE, o maior grupo parlamentar, que deverá manter ou até aumentar ligeiramente o seu peso político nos próximos 5 anos, teve um baixo desempenho face às expectativas dos cidadãos. Já os grupos ECR e ID, segundo sondagens recentes, podem crescer até + 28% e 38%, respetivamente, em número de lugares, enquanto os maiores defensores do Pacto Ecológico Europeu, como os Left, correm o risco de perder até 23% dos lugares.
Esta deriva das forças conservadoras e da extrema-direita é extremamente perigosa para a causa ambiental. São partidos normalmente negacionistas nos campos ambiental e climático que adotam sem pestanejar retóricas populistas de desinformação e de polarização e não hesitam em alavancar grupos ou classes profissionais contra evidências científicas como são as alterações climáticas. Também são por regra insensíveis aos direitos dos jovens e aos seus anseios ou mesmo ao direito à saúde de todos.
Vejamos, por exemplo, a forma como as lutas dos agricultores foram instrumentalizadas nos seus mais recentes protestos. O que os media veicularam foi a sua zanga contra medidas ambientais, designadamente a Lei do Restauro da Natureza (NRL), que jaz num limbo, mas o problema real com que o movimento dos agricultores confrontou a Comissão Europeia (CE) residiu no acordo de liberalização do comércio com o MERCOSUL. A CE impõe critérios ambientais aos agricultores na UE, mas não respeita esses critérios nas importações. Trata-se de um verdadeiro e injusto “dumping” ambiental.
Por outro lado não ouvimos queixas quanto a uma política agrícola comum que financia basicamente os grandes produtores – incluindo a casa real inglesa! – e aqueles que têm práticas mais agressivas no que respeita à promoção da biodiversidade, à manutenção da qualidade do solo ou na gestão da água. Nem se ouviu falar das assimetrias na distribuição dos proveitos nas cadeias de distribuição, que são os principais fatores que retiram rendimento aos agricultores.
A NRL ainda pode ser aprovada no último Conselho de Ministros do Ambiente deste mandato, agendado para 17 de junho – pese embora o Executivo de Luís Montenegro não se mostre preocupado em apoiar no Luxemburgo os 11 Governos europeus que procuram passar este diploma fundamental.
Por tudo isto, lembre-se: esta década é crucial para reverter o desastre ambiental e o precipício climático e o seu voto conta e muito. Pode votar em qualquer assembleia do país ou no estrangeiro. Vote em consciência e tendo em mente o futuro das gerações vindouras. Já agora, assine o Pacto Europeu pelo Futuro. Pela esperança e contra o medo!
Membro do Conselho do Gabinete Europeu de Ambiente (EEB)
Consultar o artigo online aqui.
Setúbal Mais: ' Festival CLIT - Cinema em locais inusitados e temporários arranca com muito público'
Segunda-feira, 16 de Dezembro de 2024
LER MAIS